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Lei Rouanet explicada: como funciona, quais as vantagens e quais as críticas

A Polícia Federal deflagrou na terça-feira uma operação destinada a investigar fraudes contra a Lei Rouanet, colocando a lei nacional de fomento cultural mais uma vez no olho do furacão. A operação, batizada de Boca Livre, apura o desvio de milhões de reais que teriam sido utilizados com fins ilícitos, alheios à área da cultura, somando críticas a um mecanismo que não é bandido nem mocinho e que muitos desconhecem. A Lei Rouanet foi criada em 1991, durante o Governo Fernando Collor, para que o Estado assumisse sua missão intrínseca de fomentar a Cultura brasileira – que vivia uma fase especialmente cinzenta de sua existência, com uma produção nacional de filmes, por exemplo, que tendia a zero. Hoje, 25 anos depois de sua criação, a avaliação de especialistas da área é que ela e outras que seguem o seu modelo, como a Lei do Audiovisual (à qual aplicam os longas-metragens), cumpriram a sua tarefa: só em 2015, quase 6.000 projetos foram aprovados nos moldes da Rouanet e financiados com dinheiro de isenção fiscal (quase 4 bilhões de reais no mesmo ano). O Brasil engatou numa crescente cultural, a oferta na área disparou e a lei que nasceu a partir de estudos sobre outras leis nacionais de incentivo, como a francesa, se tornou o principal financiador da Cultura do país.   A Lei Rouanet há anos é alvo de polêmicas, com o questionamento público a projetos financiados, mas a polarização política da crise levou ela de vez para o centro da discussão. Esse peso ideológico se acentuou com a extinção (e posterior recriação) do Ministério de Cultura pelo atual presidente interino, Michel Temer. Para intensificar o debate, nas últimas semanas foi protocolado na Câmara dos Deputados o pedido de abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar possíveis irregularidades na concessão de incentivos fiscais. Concordando com a lei ou não, é preciso elucidar do que estamos falando:   O que é?   A Lei Federal de Incentivo à Cultura, de número 8.313, mais conhecida por Rouanet, foi criada em 1991 pelo diplomata e filósofo Sérgio Paulo Rouanet, que foi ministro da Cultura de Collor. Ela estabelece que pessoas jurídicas e físicas possam doar parte de seu imposto de renda para apoiar projetos culturais (4% no caso das jurídicas, 6% no das físicas). A lei não permite, além do incentivo fiscal, recursos diretos do Governo federal.   Como funciona?   A Rouanet é uma lei de mecenato. Alguém ou alguma empresa com uma ideia de um projeto cultural pode formatá-lo em certos moldes específicos, com as informações devidas, e protocolá-lo em um sistema para que ele seja analisado por especialistas do Ministério da Cultura. Uma vez admitido e aprovado, esse projeto ganha um selo da Lei Rouanet e assim poderá ser apresentado a empresas ou pessoas interessadas em apoiá-lo doando parte de seu imposto (4% para pessoas jurídicas e 6% para pessoas físicas). O dinheiro é do Estado, porque representa um imposto, mas quem decide seu destino é o pagador desse imposto – o mecenas.   Pontos críticos   A principal crítica à lei Rouanet é justamente essa: que ela dá o poder a uma empresa ou a uma pessoa que não necessariamente detém conhecimentos sobre arte e cultura (e também sobre a importância cultural ou artística de determinado projeto para a sociedade) de escolher o que apoiar. O ex-ministro da Cultura Juca Ferreira (PT), por exemplo, costumava dizer que “os departamentos de marketing das empresas terminam decidindo” que projetos verão a luz, muitas vezes guiados por interesses próprios, não nacionais. “É uma parceria público-privada em que o dinheiro é público e a decisão é privada”, resumiu. Nesse contexto, critica-se também que artistas famosos sejam frequentemente contemplados, em detrimento de outros menos conhecidos. O texto da lei não veta, no entanto, que isso aconteça. Se durante a análise a proposta for considerada de viabilidade comercial, o famoso pode ter seu projeto recusado. Mesmo assim, um projeto aprovado pela Rouanet pode dar lucro. A lei possui dois mecanismos nos quais isso é possível. Um terceiro mecanismo, o Fundo Nacional de Cultura, serviria para estimular aquelas atividades não rentáveis num contexto de mercado, e a possibilidade de atrair investimento privado na forma de patrocínio. Critica-se, também, a centralização de recursos no eixo Rio-São Paulo, que aparece com o maior número de projetos aprovados.   Polarização política   Em meio à crise política e a tentativa de fechamento do Minc por Temer, políticos e cidadãos comuns, críticos ao Governo de Lula e Dilma, intensificaram suas críticas à Lei Rouanet, afirmando que essa seria mais “uma maneira de gente de esquerda mamar nas tetas do Governo”. O Governo Temer não tem endossado a crítica geral ao mecanismo. O ministro interino da Cultura, Marcelo Calero, disse, durante a primeira coletiva como titular da pasta, que a a Lei Rouanet estava sendo “satanizada”.   CPI, polêmicas e Congresso   O pedido de abertura de CPI protocolado na Câmara pelos deputados Alberto Fraga (DEM-DF) e Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) questiona os critérios utilizados na aprovação de projetos e o apoio a eventos de grande porte, que teoricamente não precisariam de auxílio estatal. A primeira polêmica nesse sentido foi em 2006, quando a companhia canadense Cirque de Soleil conseguiu captar 9,4 milhões de reais para realizar no Brasil sua turnê Saltimbanco, que tinha ingressos de até 370 reais. Outro caso polêmico é uma biografia (posteriormente cancelada) da cantora Claudia Leitte, que teve aval para captar até 355.000 reais. Há parada no Senado proposta de modificação da legislação.   Operação Boca Livre   Deflagrada pela Polícia Federal, em parceria com a Controladoria Geral da União, em São Paulo, no Rio de Janeiro e em Brasília, investiga fraudes detectadas desde 2001 e que podem chegar até 180 milhões de reais. A investigação está em curso, na realidade, desde 2014, depois que a CGU repassou informações sobre irregularidades na concessão de incentivos. Foi constatado que até uma festa de casamento foi bancada com recursos da Lei Rouanet. Fonte: El Pais

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